Recentemente participamos de um
briefing numa grande empresa que decidiu redirecionar seu posicionamento de
negócio, enfatizando uma proposta de valor baseada em servir o cliente. Até aí,
nenhuma novidade. Muitas organizações, ao fazer os exercícios de revisão
estratégica, percebem a necessidade de clarificar, de forma enfática, sua
vocação para o serviço e orientação aos clientes, diminuindo (mas não muito) a
ênfase em excelência operacional (foco nos processos) ou inovação distintiva
(foco na criação do chamado “oceano azul”). A intenção é deixar explícita a
escolha norteadora do negócio para a proximidade, interação e atendimento das
necessidades e demandas de solução para o cliente.
A primeira decorrência dessa
escolha é bastante conhecida: é fundamental adaptar o modelo de gestão, as
operações, políticas e procedimentos para que o fluxo de decisão seja coerente
com a proposta de valor. Exemplificando: os funcionários da ponta, aqueles que
têm contato mais frequente com os clientes, deverão ser retreinados para a
observância do serviço como a âncora de relacionamento e força competitiva do
negócio. É claro que o exemplo citado não esgota o cardápio de providências a
serem tomadas. Um sem-número de políticas, diretrizes, normas de conduta, guias
e manuais de atendimento terão que ser revistos à luz do novo posicionamento
estratégico.
E a “lição de casa” mal começou.
Nos primeiros ciclos de convivência com a nova orientação (os primeiros meses
de “entrega” da proposta de valor reconfigurada), o próprio efeito da mudança é
positivo e estimulador. Aumenta o índice de satisfação e de aprovação do
cliente e a força de trabalho ganha novas competências no ato de servir. Mas,
sem querer desestimular essa evolução, é bem possível que surjam as aves de mau
agouro, os guardiões do passado, quando a empresa não gastava tanto para
atender o cliente e, mesmo assim, tinha boas fatias de mercado.
Para que, então, todo esse
alvoroço? Será que não estamos descuidando da rentabilidade quando transferimos
poder aos funcionários da ponta, aqueles que não têm noção de custo/benefício e
acabam “mimando” o cliente com decisões onerosas? Esse movimento, que não é
raro de acontecer, sinaliza um aspecto típico da chamada contracultura; os
solapadores de uma nova ordem cultural que, de alguma forma, muda as relações
de poder, colocando a luz e a recompensa em outros segmentos de funcionários e,
pior ainda, questiona a estrutura de comando e controle.
Nesse ponto, chegamos ao cerne do
problema: nenhuma empresa redireciona, com vigor, sua proposta de valor se não
mudar, com igual vigor, o modelo mental predominante. A atitude constrói a
cultura. Se a intenção é redirecionar a cultura (para o ato e o valor de
servir) é essencial mobilizar o estímulo para um novo rol de atitudes. Complicado?
Bastante. Possível? Com certeza.
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