São inúmeras definições, mas resta a sensação de um conceito inacabado
Muitos anos de consultoria e um
bom número de projetos em desenvolvimento gerencial nos favorecem um olhar
experiente sobre a temática da liderança. Sem qualquer queda tendenciosa e
mal-humorada sobre a realidade dessa questão, não há como escapar de uma
percepção cada vez mais comprovada pelos fatos: a essência da liderança ainda
nos escapa entre os dedos, fugindo de uma síntese convincente. Parece que todos
nós, consultores e executivos de empresas, cedemos à magia dos rótulos e nos
deixamos levar pelo engano das definições apressadas e quase sempre
incompletas.
Esse movimento de autoengano
está longe de ser mal-intencionado, ao contrário, é perfeitamente compreensível
diante das pressões das circunstâncias para chegar, afinal, a esse estágio de
definição. Decifra-me ou te devoro, é o postulado mítico que nos impulsiona
para defender um papel principal da liderança, capaz de domar a fera das
incertezas, das turbulências e da volatilidade que nos aflige em todos os
campos de ação.
Nesse contexto, o futuro parece
exigir um superlíder, capaz de educar, orientar, inspirar, fazer e acontecer.
Seria muito bom se fosse possível. Essas figuras até existem e tiveram seu
esplendor na história das organizações e da sociedade. Mas é preciso cautela
para interpretar esses redentores. Quando se coloca a lupa da realidade,
aparecem vários atributos de coragem e competência, é verdade.
No entanto, o exame mais
particularizado mostra também os furos de intepretação, as circunstâncias
específicas e os agregados do contexto que deram seus empurrões e que, caso não
existissem, tornariam bem menor a relevância do líder e reequacionariam as
lições extraídas desses episódios. Foi assim com boa parte dos heróis da
literatura de negócios, dos guerreiros militares, dos nobres destemidos da
história. A verdade é que não há
Super-Homens...
Nietzsche, o maravilhoso e
sofrido filósofo que batizou o perfil do Super-Homem, deve dar cambalhotas no
túmulo ao ver o que os desenhos em quadrinhos fizeram com o seu conceito, já
que a ideia era outra, absolutamente diferente. O Super-Homem de Nietzsche,
aliás, não se parecia em nada com o seu próprio autor. Atormentado e inseguro,
Nietzsche projetou no seu personagem a vontade de potência, a sede de poder, e
não o ser invencível que conhecemos dos quadrinhos.
Não se trata, portanto, de
derrubar os mitos da liderança, mas sim de restabelecer uma indagação saudável
sobre a sua essência, muito além dos clichês de uma esperança descabida de um
salvador da pátria.
Ao buscar a essência da
liderança, talvez seja possível encontrar a essência da própria vida, temperada
e inconstante, vibrante e ansiosa, fantasiosa e pragmática. Afinal, como já dizia o sábio Guimarães Rosa,
“o bonito da vida é que as pessoas não estão sempre iguais; ainda não foram
terminadas”.
As pessoas são como os líderes:
vivem num eterno construir.