quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

O futuro chegou



Domenico De Masi, italiano e também cidadão honorário do Rio de Janeiro, ficou famoso pela autoria do livro O ócio criativo (2000). Agora, publica outra obra igualmente instigante: O futuro chegou - modelos de vida para uma sociedade desorientada. Recuperando informações e reflexões sobre os modelos sociais e religiosos, as estruturas políticas e econômicas e, principalmente, os sistemas de vida da Índia, China e Japão, além do Brasil, com um denso capítulo de 87 páginas.

Segundo De Masi, o livro deveria propor um novo modelo de vida para uma sociedade desorientada, mas vai além ao enumerar a riqueza da história das nações e como o homem já enfrentou (e muitas vezes venceu) dificuldades aparentemente insuperáveis, guerras e dissidências insanas, para renascer logo adiante. Citando Lourenço, o Magnífico: “Como é bela a juventude, que todavia se esvai. Quem quiser ser feliz, que o seja. Do amanhã não se tem certeza”. E é esse amanhã que De Masi tenta desmitificar - pelo excesso de pessimismo -, mas também alertar, pela incapacidade de assumirmos o papel de protagonistas e não de vítimas.

Num dos trechos do livro, De Masi expõe a desorientação dos indivíduos diante do progresso da tecnologia, submetendo o homem a um aparente paradoxo: de um lado a ampliação de recursos de conhecimentos que a tecnologia favorece; de outro a inquietação sobre os próximos estágios do progresso tecnológico, a ponto de sermos induzidos a “desconfiar do futuro”.

De Masi chama de “eternos desafios” a nossa espera constante do vento favorável, quando, muitas vezes, não sabemos com clareza para onde ir... E provoca: “Sentimos crescer, dentro de nós, a exigência de um novo modelo de vida capaz de orientar o progresso cada vez mais insensato. Mas a quem cabe o ônus de elaborar esse novo modelo?”

“Nutre a mente somente o que a alegra”, ensina Santo Agostinho, abrindo o capítulo do livro dedicado ao Modelo Brasileiro. Eterno país do futuro, o Brasil é interpretado com boa vontade duvidosa, de tão generosa. De Masi chegou a morar no Rio de Janeiro no período em que escreveu este livro. Esses pormenores não reduzem, entretanto, a riqueza da pesquisa histórica e os personagens retratados.

O trecho a seguir demonstra o exagero de interpretação: “O brasileiro é informal, trabalha em mangas de camisa e sabe operar em grupo. É fluido nos seus processos de decisão, não tem preconceitos ideológicos, aprende fazendo, tende a conjugar trabalho e divertimento, presta serviços de modo atento, afável e afetuoso”. Parece outro país, não é? Mas talvez seja a percepção de um intelectual sempre adulado e bem acompanhado quando está por aqui.

O importante é que há, no livro, um enorme e respeitoso levantamento de registros históricos. E fica, ao final, um trecho do poema Testamento, do grego Kriton Athanasoulis:


“Te deixo a minha história escrita à mão, a partir de alguma esperança. Cabe a ti terminá-la... Assim foi meu tempo. Lança um olhar doce ao nosso crepúsculo amargo... Eu conquistei a coragem de ser feroz. Esforça-te para viver. Salta o fosso sozinho e sê livre...”.